quinta-feira, 28 de setembro de 2017

SOBRE A POSTAGEM DO RELIGIOSO SR. JULIO CEZAR FERRO ACERCA DAS SAUDAÇÕES E REZAS DO BATUQUE/RS – PARTE 1


Primeiramente, me apresento: Sou praticante do Batuque do RS, Nação Jèjí Ìjeṣà, filho de João Carlos de Ọ̀ṣun, que teve seus àṣẹ finalizados por Ìyá Diva de Yemọnjá, filha de Manoelzinho do Şànpọ̀nná, filho de Paulino do Òṣàlà.

Iniciei meu aprendizado no idioma Yorùbá no ano de 2010 através da Escola de Ensino Prático do Idioma Yorùbá, administrada pelo Sr. Júlio, sendo que, em 2011, foi negado, o meu reingresso no nível II.

Após isso, decidi seguir sozinho com meus estudos sobre o idioma, inclusive, em 2012, realizei o Curso de Fruição no Idioma Yorùbá ministrado pelo Prof. Gideon Bàbálọ́lá Ìdòwú. Não sou um expert no idioma mas possuo um conhecimento bem razoável.

Em 2015,minha filha, recém nascida, realizou as cerimônias “Ẹsẹ̀ntayé” e “Ìsọmọ Lórukọ”, ambas pela Religião Tradicional Yorùbá, sendo a 2ª criança a fazer estas cerimônias no estado do RS, onde recebeu o nome de Ifáṣàánú Ifáṣọ́lá. A partir desta cerimônia, meu contato com a cultura tradicional Yorùbá aumentou consideravelmente, pois participei, como convidado, de alguns rituais e, principalmente, porque o padrinho de Ifáṣàánú encontra-se hoje em Ibadan, estado de Ọyọ́, Nigéria, portanto, meu acesso à cultura Yorùbá é bem facilitado, sempre respeitando o limite necessário que todo fundamento possui.

Devido às dúvidas geradas pelas postagens do Sr. Júlio, venho aqui, como ministrante de cursos e oficinas sobre a língua Yorùbá, me manifestar para que os praticantes do Batuque possam ter outro ponto de vista.


1 – SOBRE O LIVRO DO SR. JORGE VERARDI:

Apesar das duras palavras expostas na postagem do Sr. Júlio, realmente é impossível não concordar em algumas questões. É fato que o prof. Gideon Bàbálọ́lá Ìdòwú não participou das traduções expostas no livro. O professor Gideon se manifestou nas redes sociais, afirmando sua não participação e que iria tomar as devidas providências, inclusive através de uma postagem promovendo o livro, realizada no Facebook pelo Sr. Charles de Oxalá, a qual posteriormente foi excluída.

Sobre as rezas, traduções e fonética expostas, apesar do esforço, não saiu em contento. Claramente nota-se que o tradutor não possuía conhecimento religioso suficiente para o trabalho, bem como, ao realizar transcrições as quais foram retiradas de gravações, cometeu vários erros. Vejamos um exemplo simples, cuja reprodução, retirada do livro, conforme figura abaixo:



Yoruba: Èṣù Olode
Fonética: Exú o Lodê
Tradução: Exú, dono das ruas

Aqui existem erros de grafia e fonética. O correto é Òlóde. Na gramática Yorùbá, a formação de um substantivo, originado de outro substantivo, onde o resultado final quer indicar posse, funciona da seguinte maneira: pegamos o substantivo, no caso “òde” (parte externa, exterior, rua) e acrescenta-se o sujeito (o = aquele que) mais o verbo ( = possuir, ter). A vogal do sujeito acompanhará a vogal do substantivo, antes da elisão, no caso “ò” de “òde”. O verbo “ní”, quando precede uma vogal diferente de “i”, vira “l” e o acento tonal do verbo passa para a vogal do substantivo, portanto, o correto seria Òlóde, cuja fonética seria Olôde, visto o tom mais forte (mi) se encontra na sílaba “”: Ò (dó) (mi) de (ré). No idioma Yorùbá, os acentos acima das vogais representam os tons, ao contrário do português, que representa tonicidade. A tradução está correta, mas poderia ser também no singular (Exú, dono da rua) ou substituir a palavra “dono” por “Senhor”.

Yoruba: Èṣù, Èṣù o! Bàrà lọnà
Fonética: Exú ecuo o bará Lanã
Tradução: Exú Exú o Bará do Caminho.

Aqui temos vários erros. Nós cantamos Bara Lanã e o texto em Yorùbá colocou lọna o que gera um significado completamente diferente. A palavra “Bàrà”, com os acentos fonéticos no tom dó ( ` ), significa “melancia”. O correto é sem acento nas duas sílabas, ou seja, nos tons ré (Bara). “Làna” em Yorùbá significa “fazer ou abrir uma estrada/caminho”. Também a fonética está errada, visto que está transcrito “Exú ecuo” ao invés de “Exú Exú o”. Por que aconteceu isso? Simples: toda a parte fonética foi retirada do livro anterior e colocado no atual, sem ter sido feita uma revisão, portanto, grande dos transcritos fonéticos estão completamente errados.

Partindo do princípio fonético o qual cantamos essa reza, teríamos então:

Yoruba: Èṣù, Èṣù o, Bara Làna.
Fonética: Exú Exú o Bara Lana
Tradução: Exú Exú! Bara abra o caminho.


Continua ...